Trecho a trecho: Tudo que você precisa saber sobre o Caminho de Cora Coralina

Percorrer 300 km dentro do cerrado goiano e conhecer suas maravilhas precisa de planejamento, vem que te ajudamos

Anna Júlia Steckelberg
Por Anna Júlia Steckelberg
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“Eu sou aquela mulher a quem o tempo muito ensinou. Ensinou a amar a vida e não desistir da luta, recomeçar na derrota, renunciar a palavras e pensamentos negativos. Acreditar nos valores humanos e ser otimista.”

Para quem não a conhece, Cora Coralina, pseudônimo de Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, foi uma goiana que fez história, muito além de seu tempo. Cora era poetisa e contista brasileira.

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Considerada uma das mais importantes escritoras brasileiras, ela teve seu primeiro livro publicado em junho de 1965 (Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais), quando já tinha quase 76 anos de idade, apesar de escrever seus versos desde a adolescência.

Por incrível que pareça, ela era uma mulher simples, doceira de profissão, e mesmo tendo vivido longe dos grandes centros urbanos, alheia a modismos literários, produziu uma obra poética rica em motivos do cotidiano do interior brasileiro, em particular dos becos e ruas históricas de Goiás.

Uma curiosidade é que ela cursou apenas até a terceira série do curso primário. E em 1922 foi convidada a participar da Semana de Arte Moderna, mas foi impedida por seu marido. Foi eleita com o “Prêmio Juca Pato” da União Brasileira dos Escritores, como intelectual do ano de 1983.

Inaugurado em 2013, O Caminho de Cora Coralina é uma rota de ecoturismo, que homenageia a escritora goiana e foi inspirado no Caminho de Santiago, na Espanha. Ele mistura o que há de melhor na região do interior de Goiás: história, gastronomia, natureza e cultura. São 300km que passam por 5 cidades históricas, 8 povoados, mais de 20 igrejas, inúmeras cachoeiras e parques.

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O trecho é um verdadeiro túnel do tempo, pois remonta à época de bandeirantes e pesquisadores que descobriram diversas riquezas nas terras dos índios Goyazes, formando os primeiros povoados e cidades de Goiás. Tudo isso, misturado com alguns dos poemas de Cora em placas espalhadas pelo caminho e se deliciando com suas palavras simples e fortes.

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A trilha

Agora, entenda bem: a rota turística, que serve tanto para caminhantes quanto ciclistas, é dividida em 16 trechos que passam pelas cidades de Corumbá de Goiás, Cocalzinho, Pirenópolis, São Francisco de Goiás, Jaraguá, Itaguari, Itaberaí e Cidade de Goiás, abrangendo também os municípios de Caxambu, Radiolândia, Vila Aparecida, Alvelândia, Palestina, São Benedito, Calcilandia e Ferreiro.

A definição da rota foi inspirada em livros e relatos documentais de viajantes e naturalistas que por aqui passaram, além de informações obtidas de moradores locais. O propósito do projeto é interligar municípios, povoados, fazendas e atrativos.

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O caminho é todo sinalizado e é permitido que usuários o percorrem de forma auto-guiada. Ao longo do trecho, é possível conhecer cachoeiras, reservas ecológicas, fazendas, igrejas e cidades históricas, entre outros.

Recentemente, em 2020, O Caminho de Cora Coralina foi integrado à Rede Trilhas (Rede Nacional de Trilhas de Longo Curso e Conectividade). Essa iniciativa do Governo Federal, que tem como objetivo conectar e reconhecer pontos de interesse do patrimônio cultural e natural brasileiro por meio de trilhas de longo curso em todo o país.

Agora pasmem, nosso Caminho de Cora Coralina é o segundo percurso integrado à rede, eixo do programa Parque+, do Ministério do Meio Ambiente (MMA). O primeiro foi a trilha Transcarioca, localizada no Estado do Rio de Janeiro.

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Cada trecho adicionado ao projeto deve seguir padrões de mapeamento e identificação, com intuito de oferecer mais segurança para os turistas e usuários, para que esses possam contar com padrões de estrutura e acesso, que vão da indicação de pontos de interesse turístico, como lagos e cachoeiras, a bases para pernoite, alimentação e outros pontos de apoio.

Atualmente o Caminho está aberto, porém com algumas alterações, visto que os parques incluídos, como Parque Estadual dos Pireneus e Parque Estadual da Serra de Jaraguá estão fechados por conta da pandemia do Covid-19. Além disso, é exigido o uso de máscara em toda a rota.

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Onde fica e como chegar

O marco zero do Caminho de Cora Coralina é na cidade de Corumbá de Goiás. Ela fica a apenas 115 km de Goiânia e 130km de Brasília, o que significa uma viagem de cerca de 2h de carro a partir de uma dessas duas cidades. O ponto final é na Cidade de Goiás, que fica a 150 km de Goiânia (3h de carro) e 330 km de Brasília (5h de carro).

Quando ir

A melhor época para fazer o Caminho de Cora Coralina é entre maio e junho ou setembro e outubro. Isso porque nos meses de outono e primavera as temperaturas estão mais amenas e a água é abundante. Durante o verão você poderá enfrentar estradas muito enlameadas e os meses de inverno, especialmente agosto, o ar vai estar muito seco.

É legal também conciliar a viagem com algum dos eventos do calendário de festividades da região. As Cavalhadas acontecem entre maio e junho. A Procissão do Fogaréu é em março. Há também um festival de cinema na Cidade de Goiás, o FICA, que geralmente acontece no início de junho.

Como explorar

Toda a rota foi planejada para o cicloturismo, fazer o circuito de bicicleta é a melhor opção. É possível também fazê-lo a pé com uma mochila nas costas. Esteja preparado para andar ou pedalar de 25 a 30 km por dia.

Quanto tempo

Isso é uma questão importante para o planejamento de sua viagem. Indicamos separar duas semanas para fazer tudo com calma, se for a pé. Levando em consideração que são 300km, esse é o tempo médio que se levará com um bom passo.

Se você preferir, é possível quebrar o roteiro em partes e fazer apenas em finais de semana. Com a facilidade de acesso a partir de Brasília ou Goiânia, dá pra conhecer a região de Pirenópolis em uma vez, depois Cidade de Goiás e por aí vai.

Se você não tem tanto tempo, ou não curte tanto pedalar ou fazer trilhas, ainda há a opção de percorrer alguns trechos da rota com carro. Assim você pode usar o Caminho de Cora como base para fazer seu próprio roteiro, parando nas cidades e povoados indicados.

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Bom, se Cora Coralina fez ou não essa rota, isso fica na imaginação de quem vai conhecer. Para isso vamos te apresentar as melhores atrações de cada trecho. Confira:

Trecho 1: Corumbá – Cocalzinho (14,5 km)

No meio da Praça Matriz de Corumbá você já vê uma instalação com informações básicas do Caminho de Cora Coralina. É onde você encontra o primeiro Museu, que fica dentro da Igreja Nossa Senhora da Penha.

Este trecho não possui muita sinalização e tem muita subida. Boa sorte! Mas aproveite esse trecho para conhecer o paraíso do Salto do Corumbá. O marco zero da sua trilha conta com 7 magníficas cachoeiras, hospedagem, restaurante e muito mais.

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Trecho 2: Cocalzinho – Pirenópolis (12,7 km)

Esse trecho é um dos privilegiados. Por passar no Pico dos Pirineus, as pessoas têm uma visão panorâmica de todas as cidades ao redor de Pirenópolis. Além disso, conta com inúmeras cachoeiras, opções de hospedagem e turismo. Inclusive, é um ótimo ponto instagramável. Infelizmente o Parque Estadual dos Pireneus está fechado, mas dá para seguir trilhas alternativas e apreciar a paisagem mesmo assim.

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Trecho 3: Pirenópolis – Caxambu (30 km)

Ainda em Piri, o aventureiro continua em um caminho bonito. Rico em paisagens com formações rochosas datadas de mais de 1 bilhão de anos e cachoeiras, além de espécies típicas do cerrado, bem labiríntico.

Por fim, você pode se hospedar na cidade, comer um empadão e tomar uma cerveja. Na cidade, há pousadas das mais baratas até as mais caras.  

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Trecho 4: Caxambu – Radiolândia (17,8 km)

Este é o último trecho de relevo mais acentuado. Depois vem as estradas bem gostosas passando por dentro de fazendas. Cheios de pássaros e borboletas, percorrendo o antigo caminho dos escravos.

Essa etapa final de relevo mais íngreme vem no nível extremo, com muitos desafios, animais e pouca sinalização. E por fim, é necessário acumular forças para enfrentar a Serra do Caxambu, onde em menos de um quilômetro e meio a altitude aumenta 150 metros até atingir o topo. A paisagem é linda, aprecie de olho no GPS, cuidado para não se perder.

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Trecho 5: Radiolândia – São Francisco de Goiás (27,4 km)

Com vegetação natural preservada e o relevo mais plano, nesse trecho você atravessa pequenas propriedades e ainda pode bater um bom papo com os donos. No mínimo, passe cumprimentando todo mundo, eles abriram a terra deles para sua diversão, né? O percurso de Caxambu a Radiolândia cruza a BR-153 (Belém Brasília) até atingir a rodovia Bernardo Sayão. Aqui recomendamos você parar para descansar e se hospedar.

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Trecho 6:  São Francisco de Goiás – Jaraguá (38,5 km)

Nesse trecho nos pontos mais elevados dá pra ver as Serras do Loredo e do Chibiu. Passando por muitas fazendas e estradas rurais. Inclusive, em São Francisco tem boa estrutura para conseguir material de apoio ou para bike. Além disso, tem uma bela igreja e o Museu Histórico das Cavalhadas.

O museu é simples mas muito rico na história das Cavalhadas de São Francisco. O Rei Mouro, Zé Roberto, foi quem fundou o museu em um cômodo da sua própria casa.

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Trecho 7: Jaraguá – Vila Aparecida (17,3 km)

Este trecho tem dois sítios arqueológicos, um deles o de São Januário, incrível né? O caminho cruza a ferrovia Norte-Sul e possui o ponto de maior subida da trilha, a Serra de Jaraguá. Aja força na perna e preparação para ver toda a vista estonteante.

Para depois da pandemia, uma ótima opção para quem quer deixar o passeio ainda mais aventureiro é fazer um voo de parapente na Serra de Jaraguá. Inclusive, é possível fazer um trecho do Caminho pelos ares voando de Jaraguá até Itaguari, cidade seguinte na rota.

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Trecho 8: Vila Aparecida – Alvelândia (12,4 km)

A Vila Aparecida é um charmoso povoado pequeno com uma igreja centralizada e pessoas boas. A partir daqui O Caminho de Cora Coralina fica mamão com açúcar. É uma região de agricultura e pecuária, destacando as bananeiras para tudo quanto é canto. Há várias fazendas por perto e se acontecer algo, há quem pedir ajuda. Vale tirar várias fotos nesta região.

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Trecho 9: Alvelândia – Palestina (4,9 km)

Que tal parar em Alvelândia e tomar um sorvete? Esse trecho é bem tranquilo, mas cuidado com o sol. Já estamos quase chegando na reta final.

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Trecho 10: Palestina – Itaguari (15,3 km)

Passando por esses povoados, a aventura fica bem tranquila e rende muita conversa boa. Apesar do trecho ser fácil, a noite os túneis de árvores entre as matas remanescentes dificultam um pouco. Na Palestina há borracharia, posto de saúde e mercearia para quem precisar de apoio.

O Caminho até Itaguari também é marcado pela grande quantidade de produtores de banana. A sinalização neste trecho está impecável e o caminho é uma estrada plana.

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Trecho 11: Itaguari – Itaberaí (26,1 km)

Itaguari é bem estruturado. Dá para fazer uma parada, descansar e aproveitar a praça no centro. A partir daqui, falta pouco para chegar no final do Caminho.

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Trecho 12: Itaberaí – São Benedito (11,9 km)

Muitos aventureiros optaram por pular essa cidade, por sair um pouco da rota. Mas essa cidade é um bom ponto para quem quer dar uma parada, descansar e buscar apoio.

Além disso, se sobrar um tempinho, você pode passar na Vinícola Goiás, para se sentir na europa dentro de Goias. Provar geleias, sucos e muitos derivados da uva.

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Trecho 13: São Benedito – Calcilândia (22,8 km)

Este trecho é pouco acidentado, com predomínio de fazendas e propriedades rurais pequenas. Às vezes, tem umas subidas absurdas. Mas tem tanta paisagem bela, um laguinho, bichinhos soltos, os pássaros em abundância.

Chegando em São Benedito, por favor, coma um pão de queijo, lá é a terra do polvilho. Um não, coma vários e leve mais para comer na viagem.

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Trecho 14: Calcilândia – Ferreiro (14 km)

Esse trecho é bastante longo, com pouca sombra. Ao chegar em Calcilândia aproveite para descansar e se refrescar. A cidade não possui pontos turísticos, mas há muitas pedreiras e uma igrejinha charmosa.

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Trecho 15: Ferreiro – Cidade de Goiás (6,3 km)

O antigo vilarejo de Ferreiro tem hoje apenas uma igreja e algumas casas espalhadas. Parte do Caminho segue pela antiga Estrada Real, trilha de bandeirantes e autoridades do período colonial. 

Esse município fica próximo do Arraial de Ouro Fino. Antes de finalizar o percurso vale a pena conhecer o Arraial. Há 60 anos atrás esse povoado acabou, pois todos foram embora de lá. O que restou foram as ruínas da Igreja e as lendas. É um ótimo ponto para fazer vários clicks.

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Trecho final: Cidade de Goiás

O fim do Caminho de Cora Coralina é em sua cidade natal, na Cidade de Goiás. A chegada é em uma cidade histórica e turística, com muitos casarões e pousadas. Além disso, há o Museu da Cora Coralina. 

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Para esse passeio lembre-se de preparar bem a mala, com tênis, casaco, protetor solar, blusas com manga, repelente e lanchinho. E não se esqueça de apreciar o céu a noite, fora dos centro urbanos as estrelas e astros embelezam a escuridão.

 

Imagens: Reproduzidas da Internet