Clínicas privadas de todo país já estão em negociações avançadas para a compra de imunizantes contra a Covid-19. A aplicação dessas vacinas na rede particular deve ser liberada até o final de maio. A Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas (ABCVAC), que representa o setor, tem tratativas em fase final com a farmacêutica AstraZeneca e a espera lançar oficialmente a vacinação em junho para maiores de 18 anos mediante prescrição médica.
Segundo interlocutores do Ministério da Saúde, a pasta produziu uma Medida Provisória para liberar a comercialização de vacinas contra Covid-19 em clínicas privadas, mas ainda avalia se vai publicar o texto ou esperar que a lei que restringe a prática caia naturalmente no final de maio, uma vez que está atrelada ao Estado de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin). Na semana passada, o ministro Marcelo Queiroga assinou portaria que coloca fim à Espin dentro de 30 dias. Pela norma atual, as empresas podem comprar e administrar vacinas desde que pelo menos 50% das doses sejam doadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) e as demais sejam aplicadas de forma gratuita.
Segundo o presidente da ABCVAC, Geraldo Barbosa, a associação tem feito reuniões com o Ministério da Saúde e construirá uma nota técnica em conjunto com a pasta para orientar a vacinação na rede privada. Barbosa argumenta que vacinação particular vai facilitar o acesso aos imunizantes. A dose da vacina na rede privada custará menos de R$500, mas o preço ainda não está estabelecido. Até o momento, dados do consórcio de veículos de imprensa mostram que cerca de 76% da população está vacinada com duas doses ou dose única da vacina. Em relação à vacinação de reforço, o índice é de 40%.
— A princípio o esquema vai respeitar o mesmo intervalo usado pelo programa nacional, a gente é complementar a ele. Não teria sentido trabalhar diferente, a não ser em casos especiais em que o médico entenda que o risco de contaminação seja maior do que o esperado. Por exemplo, a gente tem países em que a cobertura vacinal está muito baixa e podemos ter brasileiros em viagem a esses países que precisam adiantar sua vacinação como reforço — afirma Barbosa.
Ainda que o fim da vigência da Espin permita a vacinação na rede privada, a visão das clínicas é de que uma Medida Provisória daria mais segurança jurídica ao processo e poderia estabelecer parâmetros para o futuro, principalmente na hipótese de novo aumento no número de casos de Covid-19 e nova emergência em saúde. Até agora, pelo menos 300 clínicas manifestaram à ABCVAC interesse em adquirir vacinas.
As clínicas só poderiam compram vacinas que conseguiram registro definitivo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Assim, apenas os imunizantes da AstraZeneca, da Pfizer e da Janssen poderiam ser adquiridos. No entanto, apenas a AstraZeneca tem negociações com as clínicas privadas.
A farmacêutica respondeu que as primeiras doses devem ser entregues às instituições ainda em maio, mas não informou quantas unidades são negociadas. Já a Pfizer afirmou que tem direcionado seus esforços aos acordos estabelecidos com os governos centrais em todo o mundo, de modo que, neste momento, não há negociações em curso com entes privados. A Janssen afirmou que não tem negociações abertas com a rede particular, mas que “reconhece o papel do setor privado no enfrentamento da pandemia e informará as partes interessadas quando outras opções de aquisição de vacinas estiverem disponíveis.”
O Ministério da Saúde e a associação têm tratado sobre a transmissão dos dados sobre a vacinação. A rede privada deve usar o mesmo sistema que é utilizado pelo SUS para notificar a vacinação dos brasileiros.
— Todo mundo que for aplicar vacina no sistema privado tem que comunicar o Ministério da Saúde no mesmo instante. Isso é a primeira coisa, não tem como entrar no processo sem fazer a integração dos dados — explica o presidente da ABCVAC.
Para o diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações Renato Kfouri o momento atual da pandemia, com redução no número de casos e ampla disponibilidade de vacinas na rede pública, favorece a ampliação da imunização para a rede privada. Ele defende, no entanto, que as clínicas particulares sigam as mesmas orientações que o Ministério da Saúde faz para as secretarias estaduais e municipais, inclusive em relação ao público-alvo para quarta dose, por exemplo. Kfouri é membro da
Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização da Covid-19, que foi criada pelo Ministério da Saúde para auxiliar tecnicamente nas decisões relativas ao enfrentamento à pandemia.
— A disponibilização da vacinação também no setor privado pode colaborar com a cobertura vacinal inclusive. Há perfis de público que eventualmente vão se beneficiar ou ter interesse de utilizar o serviço privado pra se vacinar — opina. — Não há por que esvaziar uma vacinação recomendada, com qualquer outro critério que não sejam os do ministério. Tomar quarta, quinta, sexta dose da vacina, fazer vacinação da sua cabeça não acho uma recomendação adequada. O critério nesse cenário é uma prescrição médica e se houver algum problema, evento adverso, uma reação, há uma responsabilidade do prescritor.
*Agência O Globo
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