Olhos D’Água, uma cidadezinha no interior de Goiás, fundada na década de 1930, foi assim descrita por Carlos Drummond de Andrade: “Esta, fica nas imediações de Brasília, é um lugarejo como tantos outros sem, sequer uma fumacinha de importância no quadro do desenvolvimento nacional. Seus moradores, postos à margem da sociedade embora tão prósperos, permaneceram quietos, em seus domínios, de ninguém. Sem reagir, perdido jeito de viver e fazer as coisas à sua moda antiga.”
Até a década de 1940, famílias camponesas se dedicavam à criação de gado e ao plantio de arroz, feijão, milho, mandioca, café, cana-de-açúcar e algodão. Se alimentavam daquilo que produziam e seus derivados. As casas eram construídas com madeira e fibra vegetal, assim como os currais, chiqueiros e galinheiros, além da confecção de instrumentos de trabalho agrícolas e artigos de uso doméstico (arado, rodas d’água, mobiliário, gamelas…).
O contato intermitente dos moradores de Olhos D’Água com grupos ciganos os permitiam adquirir objetos como panelas de ferro e tachos de cobre, a comunidade local teve sua auto-suficiência quebrada pela necessidade de importação de sal, principalmente do Triângulo Mineiro.
“A vida comunitária, regida pelos calendários agrícolas e religiosos, tinha nos moleirões e nas festas em homenagem aos santos os momentos mais significativos de reunião e solidariedade.”
“Olhos D’Água foi sede do município até meados dos anos 50. Com a proximidade da inauguração da nova capital, a sede do município foi roubada na calada da noite, como conta a população, para a beira da rodovia BR – 060, que liga Brasília a Goiânia. Ao virar subdistrito do Município de Alexânia, comunidade entrou em profunda depressão. A arte popular e o folclore foram abafados, e a cidade entrou em colapso.”
A cidade
Casa do Coronel Geminiano – Olhos D’Água – 1981 | Foto: Maurício Pinheiro
O povoado teve seu início de doação de terras feitas à Igreja, por fazendeiros locais, para a construção de uma capela em homenagem à Santo Antônio. No dia 8 de setembro de 1940, a primeira cruz foi levantada e, em 13 de julho de 1941, a capela estava pronta. Treze anos mais tarde, o povoado se tornou distrito do município de Corumbá, a cidade mais próxima, que possui aquitetura de característica coloniais dão a Olhos D’Água aparência muito mais antiga que sua realidade. Apenas dois anos depois de ter sido elevada ao patamar de município, a cidade regrediu à condição de vila, do dia para a noite – literalmente. Fato esse causado pela criação da capital federal.
Coronel Geminiano – Fazendeiro doador das terras – Santo Antônio – 1981 | Foto: Maurício Pinheiro
Por conta criação de Alexânia [cidade que leva esse nome em homenagem a Alex Abdala, então prefeito] foi um terrível golpe, deixando a cidade sem água e energia elétrica por 16 anos, situação causada pela transferência do gerador para a nova cidade que se erguia às margens da BR-060, a 80km de Brasília. Olhos D’Água foi se acabando, aos poucos, e cada vez mais. Os habitantes mais jovens foram atraídos pela construção da nova capital, em seguida pelas possibilidade de melhoria de vida, fazendo com que sua população fosse reduzida a poucas dezenas de indivíduos, ativos apenas em época de plantio [4 meses por ano].
1ª Feira de Trocas Olhos D’Água
1ª Feira de Trocas de Olhos D’Água | Foto: Última Parada / reprodução da internet
Então, apenas em 1974, graças a ação da educadora Laís Aderne, a autoestima da população começou a renascer, transformando a realidade local. A valorização da cultura e o projeto de arte-educação foram os primeiros passos. No mesmo ano, fora realizada a 1ª Feira de Trocas Olhos D’Água. Tradição que teve seu início nas primeiras primaveras da década de 70 e perdura até hoje, sendo realizada, sempre, no primeiro final de semana de junho e no primeiro de dezembro.
No mesmo ano aconteceu um mutirão de fiação de linha, posteriormente de novas tecelagens e tapeçarias para a abandonada Igreja de Santo Antônio. Resultando em uma microempresa, congregada por 16 artesãos, iniciativa de Maria de Fátima Pereira Dutra -, artesã, filha de Ana Maria da Silva Oliveira e Neta de Maria das Dores Pereira Dutra, também tecelãs.
Olhos D’Água do Século 21
Olhos D’Água – 2017 | Foto: Facebook
“A comunidade de Olhos d’Água descobriu que a melhor maneira de prever o futuro é inventá-lo. Unido pela maestria das mãos, um grupo de artesãos está conseguindo inverter a triste sina do êxodo rural, transformando o pacato local onde vive num próspero pólo de desenvolvimento sustentável. A receita é tão simples quanto eficaz. Sem erguer uma única chaminé, sem derrubar nenhuma árvore e nem mesmo sem construir um metro quadrado sequer de chão de fábrica, o grupo despertou na comunidade o espírito do cooperativismo, incentivou talentos tácitos e mostrou um novo rumo a seguir. E o resultado foi surpreendente, digno de virar notícia em todo o País…”
Artesãos
Dona Nega
“Eu só gosto de fazer mulheres, pois homens dão muito trabalho” conta em tom de risadas sobre a confecção de suas bonecas. Ao falar de simplicidade, simpatia e carisma, naturalmente podemos citar a adorável artesã Maria Araújo da Silva, popularmente conhecida como Dona Nega. Conhecida por fazer suas bonequinhas de pano com detalhes inusitados, cada peça é única.
Fatinha Bastos
“O cerrado é o meu grande professor, ele ensina a gente a trabalhar. Se a gente souber respeitá-lo, ele nos dá de tudo, às vezes, saio em busca de material e volto com ideias para uma nova peça ou o aperfeiçoamento de algo que já estamos produzindo”, diz ela, que, pelo menos uma vez por semana, sai pelo campo em busca de fibras, fios, capim, cipós, cabaças e inspiração. Existe um ditado popular de que é possível “tirar leite das pedras” analogia que figura o trabalho da artesã Fatinha Bastos, que é capaz de tirar arte das palhas fibras, fios, sementes e uma infinidade de materiais, divinas expressões artísticas há mais de 30 anos.
Dulce Helena
A artesã Dulce Helena Serra cria com retalhos, bordados e pinturas. Realiza belas peças em seu ateliê que fica bem na entrada da Cidade. Já são mais de 25 anos, espalhando artesanatos pela região, e em sua poltrona de bordar aperfeiçoa sua técnica constantemente.
Lourenço Silva
“Tudo começou como hobbie” diz Lourenço, confeccionar através da argila, era algo casual e produzido através de puro dom e vontade. Mas foi ao ser convidado a ensinar na Escola Municipal Agrícola Lothar Schiller, que Lourenço aperfeiçoara seu talento no uso do próprio trabalho. Hoje Lourenço exporta seu trabalho para diversas cidades de Goiás e todo Brasil, sua principal mostra continua sendo a tradicional e local Feira do Troca, que ocorre duas vezes por ano, no entanto o artesão trabalha por encomendas para aquisição e exposição durante todo ano.
Divino
Popularmente conhecido como Divinão entre os populares, este marceneiro cria belos móveis rústicos. Trabalho que realiza desde os tempos de menino, reaproveita madeiras esquecidas no cerrado e as transforma em mesas, cadeiras, camas, porteiras e por ai vai…
Cintia Gonçalves
Cintia há mais de 10 anos extrai da argila seu elemento para criar suas belas esculturas. A artista valoriza o artesanal, preservando a singularidade de cada peça e a qualidade desde a escolha da matéria prima à pintura e acabamentos. Sem o uso de torno ou qualquer maquinário, ela afirma gostar de sentir a peça em todo seu desenvolvimento, portanto o trabalho é totalmente manual. O resultado são peças lindas tão belas quanto atemporais.
Ribas e Marly
Ribas e Marly trabalham juntos e em sua casa, produzindo belas peças com madeira e tinta. São casinhas de pássaros, garrafas coloridas, placas com frases inusitadas, belas peças para decorar sua casa ou presentear.
Walda Gomes
Não somente a venda de um trabalho, como a preservação de uma tradição. O trabalho de Valda Gomes, com bucha e crochê tem esse papel. São tapetes de crochê, artigos de decoração, bonecas, dentre tudo mais que seja possível através do dom da artesã. É essa combinação que nos coloca em face de um local quase lúdico, seu ateliê na porta de casa em Olhos d’Água, standard de seu trabalho nas edições da Feira do Troca.
Hilda Freire
As peças produzidas por ela, que vão desde pratos decorativos a bonecas e imagens sacras, são de extrema delicadeza. Ilda começou a trabalhar com cerâmica há cerca de dois anos e hoje tem seu ateliê nos fundos de casa, onde também recebe seus clientes. Além da venda em seu ateliê durante todo o ano, comercializa seus trabalhos em feiras por todo o Brasil através de um programa de artesãos. “Quando conversamos com os clientes, podemos contar a história das peças, elas não ficam apenas expostas, ganham um sentido a mais”
Maria Abadia
A artesã Maria Abadia aprendeu a arte com sua mãe, e já se vão 35 anos decorando os lares de seus clientes. Cuidadosa no manuseio das palhas, nascem pelas imagens sacras, flores, anjos e demais peças decorativas. Seu trabalho é totalmente manual e usa matérias primas como urucum, açafrão e folhas do cerrado para tingir as palhas e dar mais cor ao seu trabalho.
Valdaci Morais
Com venda própria na porta de casa, Valdaci, mais conhecida como Valda, trabalha há mais de 20 anos com artesanato, e utiliza produtos naturais como bucha, barro, palha, folha de bananeira e tecido para criar suas obras, que são de extrema delicadeza. Uma das maiores inspirações de seu trabalho é a arte sacra. Valda tem em seu acervo lindas peças como santinhas feitas de palha, anjos, imagem de São Jorge em seu cavalo feito com bucha e palha, baianas e bonecas.
Mais Informações:
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