Cidade do interior de Goiás tem lindas cachoeiras e conquistou o coração de Carlos Drumond de Andrade

No coração de Goiás, entre as sinuosas estradas que conectam vilarejos encantadores, repousa Olhos D’Água, um tesouro histórico que cativou até mesmo a alma sensível de Carlos Drummond de Andrade. Fundado na década de 1930, este vilarejo situado em Alexânia é um testemunho vivo do passado, onde a simplicidade rural se mistura com a beleza natural e a rica história da região.

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Igreja Santo Antônio em Olhos D’agua, Alexânia, Goiás. Foto: @olhos_de_olhos

 

O Encanto de Olhos D’Água Pelas Palavras de Drummond

Carlos Drummond de Andrade, o renomado poeta brasileiro, descreveu Olhos D’Água como um lugar sem pretensões, um refúgio longe das miras do desenvolvimento nacional. Apesar de sua tranquilidade, este vilarejo sempre prosperou silenciosamente, seus moradores preservando suas tradições e estilo de vida em meio à natureza exuberante de Goiás.

“Esta, fica nas imediações de Brasília, é um lugarejo como tantos outros sem, sequer uma fumacinha de importância no quadro do desenvolvimento nacional. Seus moradores, postos à margem da sociedade embora tão prósperos, permaneceram quietos, em seus domínios, de ninguém. Sem reagir, perdido jeito de viver e fazer as coisas à sua moda antiga.”, afirmou Drummond.

 

Um Passado de Resiliência e Tradição

Nas décadas de 1930 e 1940, famílias camponesas transformaram a terra de Olhos D’Água em um celeiro fértil. O gado pastava livremente, enquanto campos de arroz, feijão, milho, mandioca, café, cana-de-açúcar e algodão coloriam a paisagem. As casas de madeira e fibra vegetal ecoavam com risos e histórias, enquanto o povo se reunia para celebrar seus rituais agrícolas e religiosos.

Mas a tranquilidade de Olhos D’Água foi interrompida quando a sede do município foi transferida, levando consigo não apenas o status, mas também parte da vitalidade da comunidade. O progresso chegou às margens da BR-060, deixando Olhos D’Água sem água e energia elétrica por décadas. O vilarejo, outrora vibrante, viu sua população encolher, com os jovens partindo em busca de oportunidades na cidade grande.

 

A Revitalização de uma Comunidade

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Casa do Coronel Geminiano – Olhos D’Água – 1981 | Foto: Maurício Pinheiro

Foi somente em 1974 que Olhos D’Água começou a recuperar sua autoestima, graças aos esforços da educadora Laís Aderne. O resgate da cultura local e um inovador projeto de arte-educação injetaram vida nova nas veias do vilarejo. Nasceu então a Feira de Trocas Olhos D’Água, uma tradição que atravessou décadas e continua a celebrar a riqueza cultural da região.

 

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1ª Feira de Trocas de Olhos D’Água | Foto: Última Parada / reprodução da internet

 

Explorando o Presente e o Futuro de Olhos D’Água

Bar Museu

Bar do Museu em Olhos D’agua, em Alexânia, e seus simpáticos donos. Foto: Prefeitura de Alexânia

Hoje, Olhos D’Água conta sua história através de roteiros turísticos encantadores. Os visitantes podem mergulhar nas raízes da comunidade, explorar sua igreja reconstruída e testemunhar a habilidade dos artesãos locais. A tradição da tecelagem e tapeçaria ganhou nova vida, transformando-se em uma microempresa que preserva a arte ancestral.

Neste vilarejo, cada pedra tem uma história, cada árvore sussurra antigas lendas. Em Olhos D’Água, a alma de Goiás se revela, convidando os viajantes a se perderem nas trilhas do tempo e a descobrirem a essência pura e intocada de um passado que se recusa a ser esquecido. Embarque nessa jornada e permita que Olhos D’Água, com suas cachoeiras serenas e ruas de paralelepípedos, te transporte para um mundo onde a simplicidade é a verdadeira riqueza.

 

Confira alguns atrativos locais:

 

Bar Museu

Foto: Prefeitura de Alexânia

No Bar Museu você é atendido por dois senhores simpáticos, Antônio e Cecília, que te contam histórias das várias lembranças que eles têm no bar, pessoas famosas que os visitaram, histórias de Olhos d’Água, e é claro, a linha do tratado de Tordesilhas que passa bem em frente a seu bar.

Isso tudo saboreando deliciosas pingas artesanais curtidas com diversas raízes e frutas, são mais 380 qualidades de pingas, com variados efeitos, diz dona Cecília.

Eles não possuem telefone ou e-mail, então, para conhece-los, faça uma visita. O seu bar se encontra em frente a igreja Santo Antônio, em Olhos d’Água.

 

Memorial Olhos D’água

Memorial de Olhos D'Água

Foto: Prefeitura de Alexânia

Memorial de Olhos D’Água, um lugar para aprender a história do município e interagir com a comunidade local. Mais uma atração para fazer ao visitar nosso charmoso distrito.

O memorial mostra que para trabalhar o presente e construir o futuro é preciso preservar a memória e reverenciar a história e nos desenvolver com ela.

Vá fazer uma visita! A entrada é grátis.

Endereço: Rua 14 de julho, Praça Santo Antônio – Olhos D’Água, Alexânia

 

Alambique Cambéba

Foto: Prefeitura de Alexânia

Com linha de produção própria, e canas selecionadas 100% orgânicas, o produto se desenvolve dentro dos mais rígidos padrões normativos mundiais, por isso a Cambéba tem sua produção em pequena escala, mas priorizando a primazia e o renome. Mas o ponto alto das belezas e especiarias que compõe a refinada produção é com certeza, a charmosa adega subterrânea, a 5 metros de profundidade, onde ficam armazenados os barris de carvalho contendo a bebida. O aroma é inebriante e a atmosfera do lugar é envolvente, e quem tem a oportunidade de conhecer, entende facilmente o espírito do produto.

Um fato importante e curioso é que toda produção do Alambique é exportada para Estados Unidos e Europa, onde a cachaça firmou-se como um produto de expressão, destacando-se ano após ano, em meio as mais premiadas e melhores bebidas do mundo. A cachaça é referência de estudo pela UFG e o instituto Brasileiro de Estudo de Cachaça.

Se você quiser viver esta experiência, o Alambique Cambéba está disponível para visitas agendadas.

Endereço: BR-060, S/N – Km 21 – Serra do Ouro, Alexânia

Contato: (62) 3336-2220

Sitewww.cachacadoministro.com.br

 

Alambique de Cachaça do Ministro

Foto: Prefeitura de Alexânia

O Alambique possui 80 hectares de plantio de cana, destinando normalmente 25 hectares para produção, através de rodízios, sendo dessa forma todo plantio renovado a cada 3 anos.

Local onde é produzida a Cachaça DOMINISTRO, que pertence a Carlos Átila Alvares da Silva.

Conhecido como “Ministro”, por ter sido Ministro do Tribunal de Contas da União durante mais de uma década. Após aposentar-se do TCU, confiante na boa qualidade do produto que até então produzia por hobbies, Carlos Átila decidiu consolidar e formalizar sua produção e comercialização.

A cachaça existe desde o ano de 1998, e era localizada no município de Santo Antônio do Descoberto, mas por decorrência do alagamento da barragem do Corumbá 4, teve de procurar outro lugar para se instalar. Após fazer estudos de solo e água, e vendo o potencial de Alexânia, se mudou em 2003.

A cachaça é uma das poucas registradas no estado de Goiás, seguindo todas as normas legais das instituições normativas. É produzida exclusivamente com caldo de cana de açúcar de plantio e cultivo próprios, na propriedade rural. 

Endereço: Rodovia BR – 060 Km 29 – Alexânia/GO • Caixa Postal nº 20 – CEP 72920-000

Contato: (61) 3321-2366

Sitewww.cachacadoministro.com.br

 

Outlet Premium

Conheça o Outlet

Foto: Divulgação

Outlet com mais de 75 lojas de moda com descontos e artigos para casa, além de uma praça de alimentação. Parada obrigatória para quem gosta de fazer umas comprinhas!

Telefone: (62) 3336-7300

Endereço: 360, BR-060, Alexânia

 

Paróquia Imaculado Coração de Maria

Diocese de AnápolisFoto: Divulgação Diocese de Anápolis

A bela Paróquia Imaculado Coração de Maria, fica na Praça da Matriz, no centro de Alexânia. O cartão postal da cidade com épicas e chamativas duas torres e cúpulas. Com estilo arquitetônico Romano de 1967.

Endereço: Av. Vale do Sol – Alexânia

 

Cachoeira do Ouro

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Foto: Portal das Cachoeiras

A Cachoeira do Ouro é uma pequena e belíssima queda localizada no povoado de Olhos D’Água, na cidade de Alexânia-GO. Localizada a 100km de Brasília-DF, Olhos D’Água é um aconchegante vilarejo que a cada dia atrai mais visitantes, vindos principalmente da capital federal.

Esta bela cachoeira, de fácil acesso, destaca-se principalmente pelo seu grande e refrescante poço para banho e a paisagem do rio logo acima da queda é de tirar o fôlego. Vale a visita!

 

Lago Corumbá IV

Lago Corumbá IV ganha novas atrações e agrada diferentes perfis de  visitantes - Dicas da Capital -

Foto: Divulgação

Visitar os condomínios, passeio de barco, lancha ou até alugar uma casa na beira do Lago Corumbá IV, que tem 38km de extensão por Alexânia. O clima seco do cerrado de Goiás convida os visitantes, turistas e até moradores a apreciar as águas do rio Corumbá.

 

Onde se Hospedar

 

Hotel Fazenda Cabugi

O lugar é all inclusive, com espumante e ótima gastronomia. As águas que abastecem a Hotel Fazenda Cabugi e todas as instalações do hotel, incluindo o parque aquático, são oriundas de fontes preservadas dentro da propriedade. 

Endereço: Rodovia GO 060 s/n Km 10

Telefone: (62) 3336-1199

 

Pousada Recanto Dos Ipês

Quartos modestos em uma hospedaria simples com piscina externa, terraço e jardim. Aproveita e conheça a vila e os restaurantes ao redor.

Endereço: Rua Dos Pireneus – Chácara 1 / 16 – Olhos d’Água, Alexânia 

Telefone: (62) 3322-6272

 

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Foto de Capa: @olhos_de_olhos

30 de janeiro: Hoje é dia da saudade

Você sabia que hoje é dia da saudade?

Esse sentimento que aperta o coração e povoa o imaginário dos poetas tem uma data reservada no calendário: 30 de janeiro. Na língua portuguesa, a palavra saudade ganhou uma conotação quase romântica – apesar de a gente saber que esse é um sentimento que pode ser bem desagradável. Reza a lenda que essa é uma palavra que só existe em nosso idioma, mas a verdade é que ela existe em outras línguas sim. Para comprovar isso, a palavra saudade recebe um termo exato em polonês: tesknota. Ela também consta no léxico alemão, sehnsucht, e apresenta praticamente o mesmo valor da nossa “saudade”. Confira alguns poemas e canções pra lá de propícios para a data:

Saudade

Saudade – O que será… não sei… procurei sabê-lo 
em dicionários antigos e poeirentos 
e noutros livros onde não achei o sentido 
desta doce palavra de perfis ambíguos. 

Dizem que azuis são as montanhas como ela, 
que nela se obscurecem os amores longínquos, 
e um bom e nobre amigo meu (e das estrelas) 
a nomeia num tremor de cabelos e mãos. 

Hoje em Eça de Queiroz sem cuidar a descubro, 
seu segredo se evade, sua doçura me obceca 
como uma mariposa de estranho e fino corpo 
sempre longe – tão longe! – de minhas redes tranquilas. 

Saudade… Oiça, vizinho, sabe o significado 
desta palavra branca que se evade como um peixe? 
Não… e me treme na boca seu tremor delicado… 
Saudade… 

(Pablo Neruda, in “Crepusculário” )

Ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

(Carlos Drummond de Andrade)

O luar

O luar,
é a luz do Sol que está sonhando

O tempo não pára!
A saudade é que faz as coisas pararem no tempo…

…os verdadeiros versos não são para embalar, 
mas para abalar…

A grande tristeza dos rios é não poderem levar a tua imagem…

Mario Quintana

Dia D celebra o nascimento de Carlos Drummond Andrade

Hoje dia 31 de outubro celebramos o nascimento do grande poeta Carlos Drummond de Andrade, e para comemorar esse dia Drummond ganhou o dia D, um dia inteirinho para reviver sua história e seus poemas. O Curta Mais traz para você os 10 poemas mais significativos do poeta.

 

 

A Máquina do Mundo

E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco

se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas

lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,

a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco o simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
“O que procuraste em ti ou fora de

teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo

se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste… vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”

As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge

distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos

e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber

no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar
na estranha ordem geométrica de tudo,

e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que tantos
monumentos erguidos à verdade;

e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,

tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.

Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,

a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;

como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face

que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,

passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes

em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,

baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,

se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mão pensas.

 

Congresso Internacional do Medo

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio, porque este não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de medo e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

 

Poema da purificação

Depois de tantos combates
o anjo bom matou o anjo mau
e jogou seu corpo no rio.
As água ficaram tintas
de um sangue que não descorava
e os peixes todos morreram.
Mas uma luz que ninguém soube
dizer de onde tinha vindo
apareceu para clarear o mundo,
e outro anjo pensou a ferida
do anjo batalhador.

 

Poema de Sete Faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

 

Tarde de Maio

Como esses primitivos que carregam por toda parte o
maxilar inferior de seus mortos,
assim te levo comigo, tarde de maio,
quando, ao rubor dos incêndios que consumiam a terra,
outra chama, não perceptível, tão mais devastadora,
surdamente lavrava sob meus traços cômicos,
e uma a uma, disjecta membra, deixava ainda palpitantes
e condenadas, no solo ardente, porções de minh’alma
nunca antes nem nunca mais aferidas em sua nobreza
sem fruto.

Mas os primitivos imploram à relíquia saúde e chuva,
colheita, fim do inimigo, não sei que portentos.
Eu nada te peço a ti, tarde de maio,
senão que continues, no tempo e fora dele, irreversível,
sinal de derrota que se vai consumindo a ponto de
converter-se em sinal de beleza no rosto de alguém
que, precisamente, volve o rosto e passa…
Outono é a estação em que ocorrem tais crises,
e em maio, tantas vezes, morremos.

Para renascer, eu sei, numa fictícia primavera,
já então espectrais sob o aveludado da casca,
trazendo na sombra a aderência das resinas fúnebres
com que nos ungiram, e nas vestes a poeira do carro
fúnebre, tarde de maio, em que desaparecemos,
sem que ninguém, o amor inclusive, pusesse reparo.

E os que o vissem não saberiam dizer: se era um préstito
lutuoso, arrastado, poeirento, ou um desfile carnavalesco.
Nem houve testemunha.

Nunca há testemunhas. Há desatentos. Curiosos, muitos.
Quem reconhece o drama, quando se precipita, sem máscara?
Se morro de amor, todos o ignoram
e negam. O próprio amor se desconhece e maltrata.
O próprio amor se esconde, ao jeito dos bichos caçados;
não está certo de ser amor, há tanto lavou a memória
das impurezas de barro e folha em que repousava. E resta,
perdida no ar, por que melhor se conserve,
uma particular tristeza, a imprimir seu selo nas nuvens.

 

Ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

 

Canção Final

Oh! se te amei, e quanto!
Mas não foi tanto assim.
Até os deuses claudicam
em nugas de aritmética.
Meço o passado com régua
de exagerar as distâncias.
Tudo tão triste, e o mais triste
é não ter tristeza alguma.
É não venerar os códigos
de acasalar e sofrer.
É viver tempo de sobra
sem que me sobre miragem.
Agora vou-me. Ou me vão?
Ou é vão ir ou não ir?
Oh! se te amei, e quanto,
quer dizer, nem tanto assim.

 

Para Sempre

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
— mistério profundo —
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.

 

Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para o Estados Unidos, Teresa para o
convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto
Fernandes
que não tinha entrado na história.

 

No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

Espetáculo baseado em texto de Drummond entra em cartaz

A peça “Doida”, interpretada pela atriz mineira Teuda Bara vai ser apresentada neste sábado, dia 24/10, no Teatro do Sesc Centro de Goiânia. Serão duas sessões, às 18h e 20h.  O espetáculo faz parte das comemorações da Semana Nacional do Livro.

Além do texto de Drummond, também chamado “A Doida” – presente no livro “Contos de Aprendiz” –, a dramaturgia do espetáculo conta com outros textos do escritor itabirense e pegadas de outros grandes nomes da literatura nacional, como Hilda Hilst.

A história em questão é a de que toda manhã meninos desciam para tomar banho no riacho e pegar passarinhos. Mas, achavam bom passar pela casa da Doida e provocá-la. Gerações sucessivas de moleques passaram pela casinha, miraram as vidraças e lascavam pedras. E, a Doida respondia furiosa.

Personagem

O complexo trabalho dramatúrgico foi importante para que o público possa compreender melhor essa personagem que era motivo de chacota por parte dos meninos do interior.

“Doida”

Quando: 24/10 (sábado)

Horário: 18h e 21h

Gênero: drama

Classificação: 12 anos

Duração: 50min

Ingresso: estão à venda na Central de Atendimentos do Sesc Centro e no site do Sesc Goiás em “Acesso fácil”: www.sescgo.com.br