Cobrador monta biblioteca em ônibus para atender passageiros de graça

Entre os títulos, obras de Clarice e Trevisan. A iniciativa já arrecadou 8 mil livros

Marcelo Albuquerque
Por Marcelo Albuquerque

Daquelas histórias que a gente adora mostrar, que nos inspiram e fazer crer que há uma luz no fim do túnel em meio ao caos social e tantas más notícias que vivemos ultimamente. O personagem dessa vez é o cobrador Antônio da Conceição Ferreira da Viação Piracicabana de Brasília. Uma ideia simples, criativa e cheia de solidariedade, foram suficientes para ele descobrir nos livros uma oportunidade de entreter passageiros que enfrentam até 90 minutos dentro dos ônibus diariamente para estudar ou ir ao trabalho. O caixa do coletivo virou estante para clássicos como os de Clarice Lispector e Castro Alves, que passaram a ser cedidos por até três dias. O projeto ganhou o reconhecimento da empresa que ele trabalha, e o rodoviário foi liberado da função há dez meses para expandir a iniciativa para 30 coletivos. Um detalhe importante: Ferreira até anotava o nome e telefone dos passageiros no início, mas deixou de fazê-lo porque pouquíssimos livros deixam de retornar à biblioteca.

O cobrador montou inclusive um blog para organizar melhor o projeto, visite: Cultura no ônibus

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Ideia inspirada na paixão pela literatura.

O rodoviário buscou inspiração na própria paixão pela literatura. Nascido no interior do Maranhão, ele começou a trabalhar ainda na infância para ajudar os pais agricultores e só foi alfabetizado aos 12 anos. Todo o ensino ocorreu em escolas públicas, e o homem diz que recebia pouco estímulo. “Não sabia nem soletrar direito. Uma professora que, vendo a minha luta para soletrar, me ajudou bastante. Eu gostava de ler gramática. Via as pessoas conversando de uma forma bem solta, eu queria aprender a me expressar também”, conta. “Mas, por um tempo, parece que havia um bloqueio na minha alma.” A virada aconteceu depois de ler “Capitães da areia”, de Jorge Amado. Ferreira tinha se mudado havia pouco tempo para a capital do país em busca de emprego e viu semelhanças entre os anseios dos garotos criados pelo escritor baiano e os próprios.

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O projeto ganhou o apoio da empresa e a adesão dos usuários. Já são mais de 8 mil livros!

A proposta foi se tornando conhecida, e Ferreira passou a receber cada vez mais doações de livros. Atualmente ele tem 8 mil obras. A ideia é que cada coletivo tenha sempre seis volumes. O sucesso do projeto também estimulou que Ferreira buscasse novos sonhos. O homem concluiu o ensino médio e, neste ano, começou a cursar letras em uma faculdade particular. Além disso, sempre participa de feiras literárias e encontros culturais. O caso foi mostrado pelo site G1 DF e, de tão inspiradora, fizemos questão de repercutir aqui no Curta Mais.

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Antônio da Conceição Ferreira exibe com orgulho alguns dos títulos disponíveis de graça para os passageiros.

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O cobrador começou a cursar letras em uma faculdade particular

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Antônio, sua esposa Mary, seu filho Matheus e os livros que guarda na quitinete onde mora.